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sábado, 12 de dezembro de 2009

Drama de um cético

Para o cristão, o Santíssimo reservou um lugar
Onde sua alma limpa e virtuosa descansará
Depois que seu corpo cansado voltar ao pó
E por isso não teme, pois jamais estará só

O budista traça o caminho de Siddartha
Ele conduz pelo rio da vida sua jangada
E quando se liberta de sua parte humana
Quebra a roda do carma, enfim o Nirvana

Adornos de ouro, roupas de seda, rios de mel
E dúzias de brancas virgens para escolher
Eis o que aguarda os seguidores de Maomé

Mas já o cético, este pobre idiota que não crê
Há de viver perplexo, carregando a sina de Tomé
e morrerá decrépito, esperando ver para crer

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O Tédio.

- Mestre.
Uma doença me consome e me inferniza,
A mocidade e o espírito
Resulta de uma chaga que nunca cicatriza.

Sendo o mais sábio clínico do mundo,
És também filósofo notável,
Do peito humano auscultador profundo,
Curai-me desse mal inexorável

Que me devora o organismo fibra a fibra,
Que me enevoa o cérebro e o condensa.
Eu tenho um coração que já não vibra
Suporto uma cabeça que não pensa.

- O meu amigo tem razão e dessa chaga deveras padece.

Contudo, a enfermidade, esse mal que o devora,
É um produto fatal do século de agora
O tédio é uma terrível e mortal loucura
A treva interior, a grande noite escura.

No entanto um choque, um abalo violento
Pode curá-lo, creia, apenas num momento.

Diga-me: alguma vez amou?

Nunca seu peito sangrou por uma paixão ardente?
Como a água do mar que se agita e encapela
No soturno rumor do vento e da procela!

- Nunca.

- Pois bem, meu caro!
Procure uma agitação constante
Um prazer infindo
Um gozo triunfante.

Já visitou a Grécia, Oriente, Terra Santa?
Essas terras que evocam e encantam!
Apreciou as belezas da cidade eterna?
Que deslumbra e amesquinha a geração moderna!

- Em infinitas orgias passei a mocidade
E viajando pela Terra, vi a humanidade
Como andarilho errante, as mulheres todas
Seus lábios beijei em bacanais e bodas.

Mulher nenhuma eu vi sobre a Terra tamanha
Que para mim não fosse uma visão estranha
Como parti, voltei, sem encontrar alívio
Para esse mal que assim me faz cativo.

- Então, como último recurso te receito o circo.
O famoso palhaço que a cidade encanta
Palmas e aclamações da população arranca
Talvez lhe restitua a gargalhada franca.

- Um farsante assim, tão querido e aclamado
Tem um riso de morte, um riso mascarado
Que encobre a dor sem fim do tédio e do cansaço
Foi lá que percebi meu mestre, “Sou eu esse palhaço.”

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Adaptação para poesia de um texto teatral lido através do microfone da Rádio Guarani, em Belo Horizonte, há exatos sessenta anos.
Retirado de:
http://www.overmundo.com.br/banco/o-tedio
Autor: mmmourão.